sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Ponto úmido.

Seja forte, não chore,
Não chore esta noite.
Lágrimas secas não escorrem.

Onde quer que você esteja,
Esconda-se de qualquer sentimento.
As trevas virão te buscar,
Caminhando rápido, em contentamento.

Deite em sua cama,
Ela guardará seus segredos.
O travesseiro molhado não diz nada,
Ele guarda para si, constrói enredos.

Você é a cortina na sala de jantar.
Agora ela pega fogo.
Expondo para fora o que existe dentro.

Sua lágrima clareia o vento.
O ar agora é mais leve.
Sua previsão de tempo,
Contemple o momento.

Seja forte, não chore,
Não chore esta noite.
... Lágrimas em brasa escorrem.

(Mariana Montilha)

domingo, 16 de agosto de 2009

A realidade em ficção.

Sentada na cama que há tanto tempo abrigara dias felizes, e agora era obrigada a sustentar o peso da perda. Os cachos de cabelos ruivos batiam em suas costas, unhas de esmalte vermelho descascado, unhas completamente roídas, mãos tremiam levemente, enquanto os dedos insistiam em segurar um cigarro já queimado pela metade. Ao lado de seus pés encontrava-se uma garrafa e uma taça vazias de algum vinho barato. Seu olhar castanho claro esverdeado fixo no espelho pendurado à sua frente, preso à parede fria por um barbante prestes a se romper. Sem realmente enxergá-lo. Encarando mais do que a si mesma.
O clima de vazio tão pesado que pairava no quarto era dilacerante. O peso da perda, o peso da despedida. Não existia mais conforto naquele quarto, agora tão grande, tão vazio, cheio de melancolia e tristeza... O quarto que agora era só dela. Infinitamente dela.
Levantou a mão direita. Trêmula e fria como a de um cadáver, levou o cigarro aos lábios para mais uma tragada. Prendeu a fumaça em seu pulmão por alguns segundos, seus olhos se fecharam e ela pôde visualizar momentos felizes em sua imaginação. Em sua memória ainda repleta de momentos... Bons e maus. Que escapavam por cada poro de sua pele e entrelaçavam-se a mediocridade de uma vida agora conturbada.
O cigarro acabou, a bituca foi jogada dentro da taça vazia. Abaixou a cabeça até os joelhos, seus cabelos caindo para frente, tampando a visão do espelho sem vida. Escondeu o rosto nas mãos. Ela sentia tanto medo, como conseguiria viver uma vida inteira sozinha, agora que ele havia partido? Sempre haviam sido eles dois, em tudo. Como poderia sobreviver? Como continuar andando agora que sua sustentação havia desabado?
Não havia mais chão, não havia mais caminho. Sem sua luz-guia não havia esperança. Uma vida inteira de tristeza. Uma vida inteira vivendo em um passado aconchegante, acolhedor.
Não há esperança em um quarto afogado em melancolia, enquanto o despertador toca alegremente, quebrando o completo silêncio.

(Mariana Montilha)

sábado, 15 de agosto de 2009

Sou...

Eu sou a rodovia de mão única;
Que você atravessou sem dar importância.
Eu entrelacei meus caminhos,
Em ondas de inconstância.

Minha paisagem chama, seduz.
Em cada árvore que passa,
Você se emenda, reduz.
Pela metade - do avesso.

Eu sou aquela que você fingiu não ver;
Com a alma que você fingiu não ler.
Em um instante que você fingiu não existir;
Com sentimentos que você fingiu não sentir.

Sou os cacos de vidro no chão,
Espalhados como grãos...
... Instantes antes de a instabilidade chegar,
Você me deu as mãos.

Com a chama apagada,
Em um mar de incerteza.
Com os olhos fechados,
Em um instante inexistente.

(Mariana Montilha)